sábado, 8 de fevereiro de 2014

Porque devemos temer a terceirização?

PUBLICADO EM 07/02/2014 ÀS 18:49 POR  EM NOTÍCIAS
Por Sérgio Goiana – Coordenador geral do Sindicato dos Servidores Públicos Federais de Pernambuco (Sindsep-PE) e diretor da Central Única dos Trabalhadores de Pernambuco (CUT-PE)
Desde 2004, o setor patronal, que é altamente organizado no Congresso Nacional, tenta aprovar o Projeto de Lei 4330/04. A aprovação desse PL acarretaria em um enorme prejuízo para os trabalhadores brasileiros, tanto do setor público quanto do setor privado. Trata-se de um verdadeiro atentado à organização do trabalho no Brasil e um ataque ao concurso público.
O PL libera a terceirização para a atividade-fim das empresas privadas e governamentais e permite subcontratações sem limite. Ou seja, um contrato de prestação de serviços poderia ser repassado para uma segunda empresa, desta para uma terceira, e assim por diante. Quem perde com isso, naturalmente, é o trabalhador, que terá o salário drasticamente reduzido, para que cada empresa leve a sua parte do dinheiro dele.
E a pior parte. O Projeto abre a porteira para contratações sem concurso para as empresas estatais, num flagrante desrespeito a esse princípio constitucional, indo de encontro ao processo de moralização do serviço público.
A instituição do concurso público no País colocou fim aos apadrinhamentos políticos e a posse de pessoas despreparadas nos mais diversos cargos. O apadrinhamento travou o crescimento do Brasil por muitos anos.
A meritocracia, o talento e o esforço pessoal de caga um passou a ser os maiores requisitos para se ingressar na administração pública no País, o que tem contribuído para a desburocratização, fluidez e melhoria dos serviços prestados em hospitais, escolas e demais órgãos públicos. Não podemos esquecer dos milhares de cargos comissionados que continuam sendo indicados por políticos. No entanto, nos últimos anos, a Justiça brasileira tem tomado decisões no sentido de dificultar, cada vez mais, a contratação desses cargos. Exatamente por entender que os trabalhadores dos órgãos públicos devem ser concursados.
O movimento de recomposição de pessoal no setor público brasileiro foi importante, porém se mostrou suficiente para repor apenas, em parte, o estoque e percentual de servidores ativos existentes em meados da década de 1990. Em 1992, tínhamos cerca de 680 mil servidores civis ativos. Nos governos de Collor e de Itamar não houve admissão de servidores por concurso. Entre 2003 e 2010, no entanto, 155 mil novos servidores foram
admitidos e hoje temos cerca de 600 mil servidores civis ativos.
O acesso ao trabalho por meio de concurso coloca o servidor sob direitos e deveres comuns e estáveis, podendo com isso gerar maior coesão e homogeneidade no interior da categoria como um todo, aspecto essencial para um desempenho satisfatório do Estado.
As vagas ocupadas pelos terceirizados, atualmente, correspondem às atividades-meio na maioria dos órgãos públicos e poderiam ser ocupadas por servidores de carreira. Além disso, os terceirizados muitas vezes exercem funções, como a de secretário e contínuo, em situação de igualdade, quanto à responsabilidade, com servidores de carreira. No entanto, recebem salários inferiores e não têm estabilidade. Já os donos das empresas de terceirização chegam a ganhar três vezes mais do que os valores pagos aos empregados terceirizados, segundo relatórios do TCU. Imaginem o que pode acontecer com a aprovação do PL 4.330?
A proposta favorece grupos privados e traz grandes malefícios para todo o País. Uma reforma trabalhista que põe em xeque as conquistas e as formas de organização dos trabalhadores, extinguindo garantias asseguradas.
Lembrando que em 2010, o STF afastou a transferência automática de encargos trabalhistas à Administração Pública em casos de empresas terceirizadas inadimplentes. E o projeto propõe que, em relação ao empregado terceirizado, a responsabilidade da empresa contratante seja, em regra, subsidiária. Ou seja, a empresa que contrata o serviço (o órgão público) é acionada na Justiça do Trabalho somente quando a contratada não cumpre as obrigações trabalhistas e após ter respondido, previamente, na Justiça. Com isso, ele acaba com a responsabilidade solidária do contratante principal na cobertura dos calotes que as empresas terceirizadas frequentemente dão em salários, multas e encargos devidos aos trabalhadores.
As execuções contra empresas terceirizadas são complicadas, pois elas evaporam e não têm propriedade e dinheiro . A justiça acaba condenando o responsável subsidiário, o tomador de serviço. Há casos de empresa cujo quadro societário é formado por outras empresas e algumas estão no exterior. É muito difícil uma empresa terceirizada pagar e cumprir a obrigação que foi reconhecida em uma sentença.
A terceirização, ao longo de 20 anos em que se instituiu no cenário das relações de trabalho no Brasil, desde quando foi incentivada pela Súmula 331, do TST, em 1993, serviu para o aumento vertiginoso da precarização das condições de trabalho.
No setor privado, o PL regulamente a figura da Pessoa Jurídica. Com a sua aprovação, ficará a critério das empresas a contratação do trabalhador como pessoa física ou jurídica. Evidentemente que eles irão dar prioridade a contratar mão de obra como pessoa jurídica para escapar de compromissos com encargos trabalhistas, décimo terceiro salário, férias e aposentadoria. Os trabalhadores darão sua força de trabalho e não terão os direitos que nós conquistamos durante vários anos de reivindicações.
Esse projeto é um grande retrocesso, em todos os sentidos. O Sindsep e a CUT têm lutado para, mesmo contra a vontade de grande parte dos congressistas, impedir a sua votação. Precisamos reforçar a nossa posição junto a sociedade, que mal está sabendo desse atentado devido a pouca divulgação por parte dos meios de comunicação.

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