Roberto Luis D'Ávila
Após nove meses do seu lançamento, a cada dia o Mais
Médicos confirma sua vocação eleitoreira, evidenciando fragilidades
técnicas e jurídicas.
Como jogada de marketing feita para angariar votos e simpatias, ele
sintetiza a forma simplista como os gestores buscam a solução para os
problemas que afetam a população.
É como se o aumento sem critérios da oferta de profissionais fosse
capaz de resolver o caos no qual está mergulhado o Sistema Único de
Saúde (SUS).
Equivocadamente, o foco está na quantidade –no caso, com a presença
de pessoas sem qualificação comprovada, como o caso dos 41 brasileiros
vindos da Venezuela, que, de acordo com as autoridades do próprio país,
não concluíram sua formação.
Na contramão, ficaram de lado as ações estruturantes para mudar a
realidade dos moradores das áreas mais distantes ou mesmo das periferias
dos grandes centros.
Isso é uma prova de escuta seletiva. Em maio de 2013, quando milhares
de cidadãos foram às ruas protestar contra a qualidade dos serviços
públicos, o governo federal não quis entender o recado.
De lá para cá, pouco ou nada se falou sobre a melhora do
financiamento da saúde, a modernização da gestão e o maior controle no
uso dos recursos.
Também ficaram em plano secundário as ações para a melhoria da
infraestrutura e o estímulo para atuação de médicos brasileiros na rede
pública do interior e das capitais, por meio da criação de uma carreira
de Estado específica no SUS.
Sem debates aprofundados com diferentes categorias, com universidades
ou com representantes da sociedade organizada, o Mais Médicos se
consolida como exemplo antidemocrático do gerenciamento dos interesses e
das necessidades da nação.
Ao contrário do que afirmam alguns setores, os médicos –por meio do
Conselho Federal de Medicina e de outras entidades– tentaram contribuir.
Propostas e sugestões foram encaminhadas ao Ministério da Saúde e ao Planalto. A resposta veio na forma de silêncio.
Hoje, o Mais Médicos existe como realidade torta, questionada na Justiça por abusos contra direitos humanos e trabalhistas.
Apesar dos pesados investimentos em publicidade, ele se mostra
incapaz de mudar a percepção negativa da população sobre os rumos da
assistência.
Conforme mostram pesquisas recentes, mesmo após sua implementação, o
brasileiro ainda enxerga na saúde seu principal ponto de insatisfação.
Isso ocorre porque a população não viu acontecer o que de fato esperava.
As instalações continuam precárias, os novos equipamentos não
chegaram e o acesso aos leitos e aos procedimentos de maior complexidade
ainda é demorado.
Também percebeu que o governo não investe de maneira eficiente em
saúde nem tem mecanismos de controle afinados para eliminar de vez os
desvios.
Mas, diante desse cenário desfavorável, o que fazer com os pleitos
legítimos da população? O momento exige cautela e responsabilidade, para
fazer dos limões acumulados uma bebida para aplacar a sede dos
brasileiros por justiça e dignidade.
Cabe ao governo dar passo decisivo e abandonar o paliativo midiático em favor do planejamento de longo prazo.
Somente assim o Brasil encontrará o caminho do seu desenvolvimento
econômico e social, oferecendo aos cidadãos acesso à saúde de forma
universal, com equidade e qualidade.
Fonte: Diário do Poder
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